segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

A Secretaria de Estado da Cultura promoveu o Concurso de Poesia Helena Kolody.

o poema vencedor:

a língua

ela disse (com os olhos)
“pode olhar”
(porque as mulheres conseguem falar com os olhos –
antes de conhecer as mulheres eu não sabia que os olhos falavam)
e se mexeu daquele jeito, com aquele vestido que parecia uma língua
porque não era um vestido, era uma língua
lambendo aquele corpo daquele jeito só podia ser uma língua
(eu nunca imaginei que uma mulher pudesse vestir uma língua)
e fiquei com vontade de ser vestido
porque aquele vestido estava lambendo aquela mulher
(graças a Deus eu conheci as mulheres: minha vida mudou depois disso)
e quando ela olhava para trás
daquele jeito que eu aprendi que só as mulheres conseguem fazer
(eu não sou muito perspicaz, mas aprendo ouvindo e vendo)
eu me sentia mal
é, eu me sentia mal, porque eu não sabia o que fazer
(só os atores de Hollywood sabem o que fazer numa situação dessas, daquelas,
e eu não sou ator de Hollywood)
eu sou apenas um cara que quer ser língua
quero dizer
vestido
pra poder lamber as mulheres
só isso
minha ambição é ser vestido
se é que posso chamar de ambição
porque ambição requer – pode-se usar requer? – algo mais
ambição requer ambição
tipo aquele bicho que come o próprio rabo
(isso eu não aprendi com a mulheres, aprendi na escola mesmo)
mas pensando bem (porque as mulheres gostam de homens que pensam)
talvez eu tenha entendido mal
(porque eu aprendi a ler os olhos recentemente)
quem sabe ela estivesse apenas, como direi,
talvez ela estivesse apenas à vontade
daquele jeito que só as mulheres sabem ficar
à vontade
(se existe uma coisa que ambiciono – olha ela, a ambição, de novo -,
é saber relaxar como a mulheres)
mesmo quando estão com uma língua
principalmente quando estão com uma língua
(porque não é fácil estar com uma língua,
quem já conversou com alguém sabe do que estou falando)

2 comentários:

Anônimo disse...

"só os atores de Hollywood sabem o que fazer numa situação dessas"

hahahahahahahahahahahaha

Fada sem asas disse...

o poema é federal!