Templo de culto à mercadoria, o modelo do shopping center, como o conhecemos hoje, nasceu nos Estados Unidos na década de 1950. São espaços privados, objetivamente planejados para a supremacia da ação de comprar. O que se compra nesses centros, contudo, é muito mais do que mercadoria, serviços, alimentação e lazer. Compra-se distinção social, sensação de segurança e ilusão de felicidade e liberdade.
O shopping center é um centro de comércio que se completa com alimentação (normalmente do tipo fast food), serviços (bancos, cabeleireiros, correios, academias de ginástica, consultórios médicos, escolas) e lazer (jogos eletrônicos, cinema, Internet). Ali o consumidor de mercadorias se mistura com o consumidor de serviços e de diversão, sentindo-se protegido e moderno. Fugindo de aspectos negativos dos centros das cidades e da busca conjunta de soluções para eles, os shopping centers vendem a imagem de serem locais com uma melhor “qualidade de vida” por possuírem ruas cobertas, iluminadas, limpas e seguras: praças, fontes, boulevares recriados; cinemas e atrações prontas e relativamente fáceis de serem adquiridas – ao menos para os que podem pagar. É como se o “mundo de fora”, a vida real, não lhes dissesse respeito...
O que essa catedral das mercadorias pretende é criar um espaço urbano ideal, concentrando várias opções de consumo e consagrando-se como “ponto de encontro” para uma população seleta de seres “semiformados”, incompletos, que aceitam fenômenos historicamente construídos como se fizessem parte do curso da natureza. O imaginário que se impõe é o da plenitude da vida pelo consumo. Nesses espaços, podemos ocupar-nos apenas dos nossos desejos – aguçados com as inúmeras possibilidades disponíveis de aquisição. Prevalece a idéia do “compro, logo existo”.
Concluímos que esse mundo de sonhos que é o shopping center acaba reforçando nas pessoas uma visão individualista da vida, onde os valores propagados são todos relacionados às necessidades e aos desejos individuais – “eu quero, eu posso, eu compro”. Assim, colabora para uma deterioração do ser social e o retardamento do projeto de emancipação de seres mais conscientes, autônomos, prontos para a sociabilidade coletiva – que exige a capacidade da troca desinteressada, da tolerância, da relação verdadeiramente humana entre o eu e o outro, entre iguais e entre diferentes. Compreendemos que um ser social emancipado identifica as necessidades individuais com as da coletividade, sem colocá-las em campos opostos.
O shopping center híbrido representa hoje o principal lugar da “sociedade de consumo”, contribuindo para a sacralização do modo de vida consumista e alienado, um modo de vida em que há uma evidente predominância de símbolos como status, poder, distinção, jovialidade, virilidade etc. sobre a utilidade das mercadorias. O que se pode concluir é que o sucesso da fórmula atual do shopping center híbrido como lugar privilegiado para a realização da lógica consumista traz consigo o fracasso da plenitude do ser social, distanciando-o de qualquer projeto de emancipação e de humanização do ser humano. Como diz o poeta Carlos Drummond de Andrade [1902–1987] no poema Eu, etiqueta: “Já não me convém o título de homem./ Meu nome novo é coisa./ Eu sou a coisa, coisamente.”
(Adaptado de PADILHA, Valquíria. A sociologia vai ao shopping center. Ciência Hoje, mai. 2007, p. 30–35.)
2 comentários:
o mais legal é ir ao shopping com a mamãe e com o papai.
quem postou?
eu.
apesar de não ligar muito pra shopping, eu vou às vezes...
pegar um cineminha e tal, haha.
quando li esse texto me lembrei da Paula, que não entra em shopping... é verdade, não é Paula? hahaha.
texto legal e autora deste (pelo qu'eu conheço dela) legal também.
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